30 de setembro de 2010

"Somos feitos da mesma matéria, somo iguais. Tu devias amar-me tal como eu te amo, devias! Antigamente olhávamos para a lua e fazíamos promessas, planos para o futuro. Disseste-me muitas vezes que querias ter uma filha com pele cor-de-neve e olhos claros. O nome não importava mas tu gostavas especialmente de Margarida. E era assim que a lua desfazia a solidão de um pequeno romance já gasto. Estávamos ali, diante de uma janela, diante de um futuro a dois. Tive  medo, eu sempre tive medo. Receava estar a mentir-te, receava estares a mentir-me. Não valia a pena dialogar num leito de palavras doces, amar-te chegava, saber que nos amávamos chegava. Assim foi...
Hoje somos casados, temos uma filha de pele dourada e olhos escuros. As palavras estão cada vez mais usadas, deterioradas de tanto trivialismo. Vivemos na mesma casa, mas agora nem abrimos a janela. O meu medo transformou-se em hábito, a certeza do nosso amor caiu, e eu, num tom confessional, digo que não me pertenço. Nós mentimo-nos toda a vida, eu menti-te, tu mentiste-me. Realmente nós nem nos amamos, nunca nos amamos. A nossa filha chama-se Beatriz mas isso agora pouco importa.

-Talvez isto não seja o amor que sempre sonhamos João.
-João? (retorquis-te com uma expressão interrogatória)
-Sim João, não nos amamos, eu pensava que sim, acreditava mesmo. Possuíamos apenas uma série de banalidades: a história do colégio, a paixão quente da adolescência, um rumo semelhante. 
-Eu sou o Rui.

Agora apercebo-me que te amei sem te amar."


  Fica um sorriso da querida Irís Tomazini.